quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Duas quadras e sete andares

     Caminhava com os olhos pregados no chão, ao encontro de alguma coisa que fosse me render menos horas de sono por semana e a sonhada dose peculiar de dopamina que é o êxtase de ficar assistindo rodar a imagem de alguém na sala de cinema da memória.
     Os ponteiros do relógio marcavam oito da noite. Agora, se realmente eram oito da noite eu não tinha idéia. Há dias andava meio estabanado, entre xícaras de café e cloridrato de metilfenidato que pareciam não mais surtir efeito em relação à minha desatenção constante, mas pela ausência do sol meu relógio podia estar sendo verdadeiro. Não conseguia mais ver nenhum tipo de filme. Dias atrás tentei ver um drama, desses clichês cults ao melhor estilo Woody Allen, mas ou me pego pensando em o que vou fazer depois, ou que estou cansado de ficar colecionando romances de dois meses ou algo que o valha.
     Conversei com um velho aqui no metrô, anteontem, ele me dizia que sua mulher estava com câncer e que, até o dia da notícia, um tanto quanto fúnebre, ele planejava um divórcio, coisa que desistiu na hora em que ela contou de sua doença e que teria no máximo mais uns três meses de vida.
     A todo instante me perguntava, chocado, do por que daquele velho homem estar me falando de sua vida pessoal, não que eu não estivesse comovido, até pensei em chorar, por uns 15 segundos, mas essa vontade passou em seguida. O senhor dos cabelos brancos, apelidado de “Mr. Oldman” pela minha mente inquieta, nem me deixou lhe indagar e se despediu.
     Peguei o trem e segui em direção ao meu apartamento. Todas aquelas pessoas sentadas ali, ao meu redor, pareciam estar doentes, não via um brilho de motivação em todos aqueles olhos. Mas o que eu podia falar? Meu olhar era o mais doentio de todos. Quem sabe mais doente que o da esposa do “Mr. Oldman”, talvez, seria este o motivo dele vir até mim para contar de sua desventura, pra que eu criasse vergonha na cara e fizesse minha vida transbordar de intensidade como já foi em uma ‘outra’ não tão distante.
     O trem acabara de desembarcar em seu destino, duas quadras e sete andares pra chegar ao meu retiro. Sentia-me diferente, não havia vontade qualquer de deitar na cama e ser derrotado pela insônia, e já estava lá pelo quarto andar e ainda não tinha mudado de idéia. Quiçá eu estivesse curado, ou simplesmente tão amargurado a ponto de deixar essa cidade cosmopolita me abraçar.


Gabriel Andreolli.

9 comentários:

Anônimo disse...

aah, voce é o meu cara sem escrupulos <3 OHRAOHRAOHRAR

o próximo quero colorido .-. nada muito restart, ok? HAHA

Unknown disse...

Muito bom o texto. Vários detalhes. É um excelente início para um livro. Por que nao continua? Abraço!

Ana Bassani disse...

Você e seu incrível poder de escrever e confundir a cabeça de quem lê e, como sempre, imprevisível! Ninguém sabe o que se passa nessa sua mente surpreendente e insana. Parabéns por mais um ótimo texto!

TODO PÁ DO BAGULHO

Alexandre Zampiva disse...

De tão pouco que te conheço pareço entrar em tua mente, muito bom o texto, bom mesmo. Parece que está conseguindo colocar o que sente direto no papel... vai firme.. gostei da idéia do @alexandre_fri continua quem sabe não rola um livro... tem cara de Best Seller.

Falow pac...

A escrita é sempre bem feita quando é o que se sente e se vive que passa para o papel, sem estilo, sem escola, sem ao menos esmola... escrever por escrever.

Ma disse...

Esse é de longe um dos melhores que ja li aqui,parabéns Ga,vc melhora a cada dia,me orgulho mto de vc :)

Anônimo disse...

muy bueno cabrón! call me papi! ;)

aproveita esse ócio ai.. que alguém roubou todas os meus pensamentos...

meu amor é burrão!

Ass: T. Pelligro

Ana Paula disse...

Cada dia você me surpreende mais! Meus parabéns pelo ótimo texto! :)

Te quiero :*

Alessandra disse...

Sem dúvida alguma um ótimo texto! Li alguns de seus outros textos mas este está realmente muito bom. História verídica?
Meus parabéns, continue escrevendo e prendendo as pessoas.

lilac disse...

Li tanto que até sonhei.